Herança internacional: como fazer o inventário quando há bens em outro país?

A herança internacional envolve questões jurídicas complexas, especialmente quando há bens em diferentes países. A globalização e a mobilidade de indivíduos ao redor do mundo aumentaram significativamente os casos em que o patrimônio de um falecido está distribuído entre diversos países. Quando há bens em outros países, o processo de inventário se torna mais desafiador, pois envolve diferentes legislações, tributações e requisitos legais.

Este artigo explora como o inventário deve ser conduzido quando há bens em outro país, as implicações jurídicas envolvidas, e as opções disponíveis para os herdeiros enfrentarem as dificuldades associadas à sucessão internacional de bens.

O que é herança internacional?

A herança internacional ocorre quando a pessoa falecida deixa bens localizados em diferentes países. Esses bens podem incluir imóveis, contas bancárias, investimentos, veículos, entre outros. Quando isso ocorre, o processo de inventário não se limita às fronteiras de um único país, exigindo uma coordenação entre diferentes jurisdições e a consideração de normas internacionais.

O principal desafio em uma herança internacional está na aplicação de diferentes sistemas jurídicos para a sucessão, o que pode gerar conflitos sobre qual país tem autoridade para julgar o caso e sobre as leis que devem ser aplicadas na partilha dos bens. Em alguns países, a sucessão de bens é regida pela legislação local, enquanto em outros, a legislação do país de residência do falecido ou o país de sua nacionalidade pode ser priorizada.

As implicações da existência de bens em diferentes países

Quando o falecido possui bens em outros países, as questões legais e práticas se tornam mais complicadas. Em primeiro lugar, os herdeiros precisam entender as leis sucessórias do país onde os bens estão localizados. Cada país tem suas próprias regras sobre como os bens são distribuídos, quem tem direito à herança, quais documentos são necessários e como o inventário deve ser conduzido.

Além disso, é importante que os herdeiros se atentem à tributação internacional. Os bens localizados em outros países podem estar sujeitos a impostos sobre heranças, como o imposto de sucessão, que varia de acordo com a legislação do país em que os bens estão situados. Essa tributação pode ser diferente da tributação aplicada no país de residência do falecido, o que exige um planejamento cuidadoso para evitar a bitributação e garantir que os herdeiros cumpram todas as obrigações fiscais.

A Convenção sobre Sucessões Internacionais e a aplicação das leis

Para tentar minimizar os conflitos de jurisdição e as complexidades associadas à herança internacional, a Convenção sobre Sucessões Internacionais (também conhecida como Convenção de Haia, de 1989) foi criada para harmonizar as leis sucessórias em diversos países. Essa convenção estabelece regras sobre qual legislação deve ser aplicada em casos de sucessão que envolvem bens localizados em diferentes países.

A convenção permite que a pessoa falecida escolha a legislação de seu país de nacionalidade ou residência habitual para regular a sucessão, o que facilita o processo para os herdeiros, pois evita que eles tenham que se submeter a diferentes sistemas jurídicos. A aplicação dessa convenção depende de os países envolvidos serem signatários, portanto, os herdeiros devem verificar se os países onde os bens estão localizados e onde residiam têm tratados de sucessão internacional.

O papel do advogado na herança internacional

Quando o falecido deixa bens em outro país, o papel do advogado especializado em direito internacional sucessório se torna fundamental. Um advogado com experiência em sucessões internacionais pode ajudar a guiar os herdeiros pelo processo, auxiliando na análise das leis de cada país envolvido e garantindo que todas as etapas sejam cumpridas corretamente.

Entre as funções do advogado estão:

  • Verificar a legislação aplicável: O advogado ajuda a determinar qual sistema jurídico será aplicado, dependendo da nacionalidade, residência do falecido e local dos bens.
  • Coordenar com advogados estrangeiros: Caso os bens estejam localizados em outro país, o advogado poderá recomendar ou coordenar com um advogado no país estrangeiro, garantindo que as leis locais sejam respeitadas.
  • Lidar com a documentação necessária: A sucessão internacional de bens exige uma grande quantidade de documentos, como certidão de óbito, procurações, inventário e outros, que devem ser adequadamente preparados e traduzidos.
  • Prevenir a bitributação: Em muitos casos, a herança pode ser tributada tanto no país de origem quanto no país onde os bens estão localizados. O advogado pode auxiliar no planejamento para evitar que os herdeiros paguem imposto duas vezes sobre os mesmos bens.

O processo de inventário quando há bens em outros países

O processo de inventário de bens internacionais envolve a realização do inventário em cada país onde os bens estão localizados. Isso pode significar que os herdeiros precisarão passar por procedimentos sucessórios distintos, dependendo da legislação de cada país.

O procedimento básico geralmente segue as etapas de:

  1. Abertura do inventário: No país onde os bens estão localizados, o inventário precisa ser aberto e os bens devem ser identificados e avaliados. No Brasil, esse processo é feito por meio de uma petição ao juiz, mas em outros países, as formalidades podem variar.
  2. Pagamento de impostos: Os impostos de herança ou sucessão devem ser pagos no país onde os bens estão localizados. Isso pode envolver a avaliação dos bens e o cálculo do valor devido.
  3. Distribuição dos bens: Após a quitação das dívidas e impostos, os bens podem ser divididos entre os herdeiros, de acordo com a legislação aplicável. Em alguns casos, a divisão pode ser complexa se houver diferentes interpretações das leis de sucessão.

Nos casos em que o processo judicial for necessário, os herdeiros podem precisar contratar advogados em cada país para garantir que todas as formalidades sejam atendidas de acordo com a legislação local.

Testamento internacional e planejamento sucessório

Uma maneira de facilitar o processo de sucessão internacional é por meio do testamento internacional. Esse tipo de testamento é uma ferramenta jurídica que permite ao falecido escolher a legislação de seu país de residência ou nacionalidade para regular a sucessão, além de indicar claramente a distribuição dos bens, independentemente de onde eles estejam localizados.

O testamento internacional pode ser feito conforme as normas da Convenção de Haia e tem validade em vários países signatários. Com um testamento internacional, o processo de inventário tende a ser mais simples, pois os herdeiros terão uma orientação clara sobre como os bens devem ser distribuídos e qual legislação será aplicada.

Além disso, o planejamento sucessório, incluindo a constituição de holdings ou outras estruturas jurídicas, pode ajudar a facilitar a gestão dos bens internacionais e a evitar complicações tributárias, especialmente quando o patrimônio é significativo e envolvem múltiplos países.

A questão da dupla tributação e acordos internacionais

Uma das principais preocupações em um inventário internacional é a dupla tributação, onde os bens podem ser taxados tanto no país onde estão localizados quanto no país de residência do falecido ou dos herdeiros. Para evitar essa situação, muitos países têm acordos de bitributação, que visam garantir que os herdeiros não sejam obrigados a pagar o mesmo imposto em mais de um país sobre os mesmos bens.

Esses acordos estabelecem regras específicas sobre qual país tem o direito de tributar os bens e como os impostos devem ser calculados. Para garantir que a dupla tributação não ocorra, é fundamental que os herdeiros se consultem com advogados especializados em tributação internacional, que podem orientá-los sobre a melhor forma de reduzir os encargos fiscais.

Conclusão

A sucessão de bens internacionais é um processo complexo, mas com o devido planejamento sucessório e o auxílio de advogados especializados, os herdeiros podem enfrentar as dificuldades com mais segurança. A chave para um processo bem-sucedido de herança internacional está na antecipação de possíveis complicações, como as diferenças entre os sistemas jurídicos, a necessidade de pagamento de impostos em diferentes países e as questões relacionadas à gestão dos bens. O planejamento sucessório adequado, o uso de testamentos internacionais e o acompanhamento jurídico profissional são essenciais para garantir que o processo de inventário transcorra de forma eficiente e sem prejuízos para os herdeiros.

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